Wesley Faria
Era tarde, eu me lembro, vela acesa.
Pouca gente esperava na sala.
Pouca comida parava na mesa.
Um barulho de trovão, uns meninos apertavam as mãos,
Cada estalo era o início de outra oração, porque não se pode terminar oração com barulho de trovão.
Eu, pequeno, sentado e olhando, registrava cada cena, nem sentia o cheiro da poeira da rua vermelha.
A chuva caía de leve, as calças todas manchadas na beira, um vermelho-barro-sujo, uns dez chinelos na esteira...e o cachorro latiu com medo, Dona Nair disse depressa:
"Oh! Menino! Vá ver! Que a reza não pode parar!"
E lá fui eu na chuva e no barro, saltando as poças e tremendo com o barulho dos estalos,
"Corre menino, abra aqui! Não vê que tá chovendo?!"
Eu parei, na verdade não fui eu quem parou, foi o mundo que parou de girar, só pra ela não se molhar. A água parou de chiar, a tarde parou de cair, o cachorro parou de latir e o sol paralisou, lá no ar.
O tempo preso na cuia, a reza parada no meio e ela num vestido vermelho, me olhando na porta da frente.
Eu, besta e sorridente, com o estômago revirado de tanta borboleta que voava lá dentro, abri o portão e ela passou.
A barra da saia dela lambia o barro do chão, e lá fiquei...
Tentando entender a primeira vez que uma santa chegou atrasada na oração.
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