sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Recomeço

Recomeço.
Wesley Faria 

No tempo em que a lembrança era doce e o vento pastoreava as nuvens flocadas do céu, reunia lembranças, cantarolava em pequenas melodias matinais temperadas com a luz que entrava pela fresta da renda que improvisava uma cortina na sala da casa de meus pais.

Não sabia se a tradução correta para o tímido sentimento que brotava ao acordar vendo o cenário intacto que me tornou tudo que sou hoje em dia. Apelidei carinhosamente este sentido de "cheiro de casa de mãe" e ainda posso sentir quando caminho por lugarejos empoeirados ou toco um ou dois acordes sussurrando modas de viola ou poesias encravadas em meu peito com a navalha de lâmina cega que entalha e fere de maneira sutil.

Neste tempo, tempo de cheiro de bolo, tempo de leite fervido, tempo de cheiro de flor e de sol recém erguido foi o tempo no qual mais aprendi. Hoje passo pelas multidões com suas frases de efeito, aceleradas em seus sonhos tangíveis, lugares onde coisas substituiram vontades. Passo lentamente com a viola, companheira de estrada e percebo que quando se tem a lembrança doce do "Cheiro de casa de mãe" todos os caminhos se tornam planícies desertas.

Talvez o rastro dos passos que deixo passes sem serem notados, como folhas no riacho, talvez passem feito os galhos mais altos que estão lá e não se podem ver. Passo feito sombra, como todo escritor deveria passar, não me queixo, de fato deixo um novo sonho me tomar, a vontade peculiar de me tornar um sussurro na lembrança de quem me toca com olhares os textos que despejo ao mundo.

No tempo que a vida era poesia, acordes e esse tal 'Cheiro de Casa de Mãe' meus dias eram iluminados e as foices eram apenas um instrumento da lavoura. Hoje o campo me aguarda novamente e sei que vou rever o velho limoeiro, o riacho brejeiro que a enchente muda de ano em ano e o velho morro inatingível que, mesmo hoje em dia, podendo facilmente alcançar seu topo, prefiro mantê-lo como uma grande utopia, talvez para reter o tom de infância que guardo na memória.

Me desfaço em poesia, espalho um pouco de mim por aí,
Sou recebido por estrelas e só restarão minhas palavras,
Lembrando que um dia vivi.

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