sábado, 31 de agosto de 2013

Contra-o-tempo

Contra-o-tempoWesley Faria 

De veras nasci no tempo errado,
Não tenho paciência com soldado,
Não sei tocar bandolim,
Não faço nada direito,
Não que isso seja ruim.

Sr. Pedro sempre diz o seguinte:
- Vieste direto dos anos 20, direto para esta cidade.
E quando reparo os meus trajes, colete, chapéu de pajem,
Vejo que tem razão, de fato diz a verdade.

Dona Deia me acha esquisito,
Diz que tudo, no fim, me irrita,
É que não tenho jeito com gente,
Gente que não me habita,
Sei que Dona Déia gosta
De tudo que a gente faz,
Mas sei também que aposta
Que logo acho um caminho e largo tudo pra trás,
E quando reparo meus pés,
Virados sempre pra o além,
Vejo que tem razão,
De fato quer o meu bem.

Tem um moço que já me viu mal,
Mas não lembro de ter me visto chorar,
Seu Thiago Luz é o nome,
Deve estar em algum lugar,
Esse é um caso sério,
Amigo pra mim é sagrado,
Não vejo nenhum mistério em querer um amigo do lado.
E quando reparo meus réis,
Vejo que não tenho nada,
Vejo que tem razão,
De fato amigo é estrada.

Das mais antigas memórias, de um irmão sempre vou me lembrar,
Sr. Maicon Silveira sempre repete que o palco é meu lugar,
Seu sonho se compara ao meu, sempre com o brilho no olhar,
Mas o mundo girou diferente e um novo sonho ele foi trilhar.
E quando reparo meus dias, vontade de para todos cantar,
Vejo que tem razão, de fato a arte é meu ar.

Srta. Brunna Monteiro, com luz no seu coração,
Sempre me diz que o dinheiro não compra o talento, só o pão.
Depois de lágrimas boas, ruins e sem um porém,
Vejo que nossa irmandade, com certeza vem do além.
E quando reparo meus olhos, sempre esperando por alguém,
Vejo que tem razão, de fato já sou um refém.

Sei que estou no tempo errado,
Meu violão é um regalo,
Vejo campo, poesia e flor,
Todo canto me fala de amor,
É verdade que tudo que falo,
Ou quase tudo, tem mistério,
É que aprendi, com meu peito,
A nunca dizer que pondero.

Entre tantos pensamentos,
Tanta gente de talento,
Não ter ouro me ensinou
A não sentir-me pequeno,
A cifra destrói mais que ajuda,
E eu, que nunca disse - Me acuda!
Vou por ai com meus versos,
Até que alguém os descubra.

Meus versos são feitos para alguém,
Sei que os do Sr. Lucas também,
Ele sempre sorri do embaraço,
Que sempre me ponho refém,
Ai me gargalha de laço,
Me enlaço e gargalho também.

E escrevo para quem ama,
E para quem sofre por bem,
Dona Raissa me disse,
Que vivo uma vida além,
Me disse que tudo que faço,
É como um filme, porém,
A vida real é um regaço,
Que nem todo mundo convém,
Prefiro meus versos de mato,
Que dizem de um só querer bem,
Falo de rio e riacho,
Do bem-te-vi que vai e vem.

Falo de morro, de uva de cacho,
Falo do tempo de avô,
É que nascido no tempo errado,
Como Amiga Tatty falou,
Me disse sem muito embaraço,
Que o mundo que me criou,
É o mesmo mundo encantado,
Por quem seu peito calou.
E quando reparo meus dedos,
Sempre a buscar o céu,
Vejo que tem razão, meu céu está no chapéu,
Por isso sempre o levo comigo,
Porque se um dia eu lhe digo
Que vou voar e já volto,
Coloco meu céu na cabeça
E danço a canção que eu mesmo toco,
Assim me sinto mais parte,
Assim eu não me desloco,
Assim sou feliz, é oque acho,
Assim minha vida tem rumo,
Feito aquele passarinho,
Azul-cinzento, o Sanhaço.

Meu tempo é quando eu quiser,
Meu tempo sou eu é que faço,
Meu relógio de bolso me diz,
Quando é hora do meu cansaço,
Assim, de levinho me vou,
Verso em prosa e meu violão,
Serenata para Dona Camila,
Que me deu uma dose de sua alegria
Me abraçou e me deu um colchão,
Foram dias de paz e sorrisos,
Foram dias de inspiração.

Minha vida é carinho, é espaço,
É um ir descobrir novo ninho,
E se um dia me sentir sozinho,
Assim, de mansinho, me abraço.

sábado, 24 de agosto de 2013

Do fogo ao Afago.


Do fogo ao Afago.
W.Faria


Segue tua chama,
Chama teu guia,
Corta teu sangue,
Requer sintonia.

Faz teu peito em brasa,
Abraça teu redentor,
Escolhe teu salto alto,
Escolhe teu equador.

Trilha teu trilho sem medo
E saiba que nada é segredo,
Somente te engana os olhos,
Quando diz que é teu enredo.

Criança aos olhos do sol,
És o macio e denso lençol,
Filtro mais denso que trago,
És anjo na terra,
Do fogo ao afago, és a guerra.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Recomeço

Recomeço.
Wesley Faria 

No tempo em que a lembrança era doce e o vento pastoreava as nuvens flocadas do céu, reunia lembranças, cantarolava em pequenas melodias matinais temperadas com a luz que entrava pela fresta da renda que improvisava uma cortina na sala da casa de meus pais.

Não sabia se a tradução correta para o tímido sentimento que brotava ao acordar vendo o cenário intacto que me tornou tudo que sou hoje em dia. Apelidei carinhosamente este sentido de "cheiro de casa de mãe" e ainda posso sentir quando caminho por lugarejos empoeirados ou toco um ou dois acordes sussurrando modas de viola ou poesias encravadas em meu peito com a navalha de lâmina cega que entalha e fere de maneira sutil.

Neste tempo, tempo de cheiro de bolo, tempo de leite fervido, tempo de cheiro de flor e de sol recém erguido foi o tempo no qual mais aprendi. Hoje passo pelas multidões com suas frases de efeito, aceleradas em seus sonhos tangíveis, lugares onde coisas substituiram vontades. Passo lentamente com a viola, companheira de estrada e percebo que quando se tem a lembrança doce do "Cheiro de casa de mãe" todos os caminhos se tornam planícies desertas.

Talvez o rastro dos passos que deixo passes sem serem notados, como folhas no riacho, talvez passem feito os galhos mais altos que estão lá e não se podem ver. Passo feito sombra, como todo escritor deveria passar, não me queixo, de fato deixo um novo sonho me tomar, a vontade peculiar de me tornar um sussurro na lembrança de quem me toca com olhares os textos que despejo ao mundo.

No tempo que a vida era poesia, acordes e esse tal 'Cheiro de Casa de Mãe' meus dias eram iluminados e as foices eram apenas um instrumento da lavoura. Hoje o campo me aguarda novamente e sei que vou rever o velho limoeiro, o riacho brejeiro que a enchente muda de ano em ano e o velho morro inatingível que, mesmo hoje em dia, podendo facilmente alcançar seu topo, prefiro mantê-lo como uma grande utopia, talvez para reter o tom de infância que guardo na memória.

Me desfaço em poesia, espalho um pouco de mim por aí,
Sou recebido por estrelas e só restarão minhas palavras,
Lembrando que um dia vivi.